Por Edson Lau
*Escrito em coautoria com Leandro Consentino, Doutor em Ciência Política (USP) e Professor de graduação em Economia e Administração e Programa Avançado em Gestão Pública do Insper
A primeira década do século XXI nos insere em um contexto de desconfiança generalizada, sobre a política, suas instituições, atores e a imprensa. Até mesmo ferramentas que deveriam nos ajudar no debate público, são alvos de ataques.
Este é o caso das pesquisas eleitorais, que, antes vistas como bússolas do comportamento do eleitorado, nos últimos tempos têm sido constantemente criticadas por supostas disparidades entre os diversos institutos que as realizam e pelo baixo poder preditivo no que diz respeito aos resultados eleitorais, principalmente em grandes e complexas democracias como é o caso do Brasil.
Contudo, é fundamental ter presente alguns pressupostos antes de recolhermos as pedras para atirá-las contra esse importante instrumento para as sociedades democráticas. O primeiro deles diz respeito ao fato de que se trata de um recurso estatístico e, portanto, com poder aproximado de acerto, a depender da metodologia utilizada e de amostras amplas.
Nesse sentido, precisamos atentar mais para o intervalo delimitado entre as chamadas “margens de erro” do que para o centro delas, exposto nas manchetes. Além disso, devemos levar em conta as diferentes metodologias – inclusive no formato das entrevistas – a fim de compreender suas disparidades e variações, ainda que sobre um mesmo pleito.
Por fim, como os analistas políticos sempre repetimos, cabe sempre lembrar que uma pesquisa eleitoral é o retrato daquele momento e não o do resultado das urnas. Serve bem ao propósito de orientar as campanhas dos candidatos e conhecer o sentimento dos eleitores. Além disso, quando um candidato desponta nas pesquisas há uma atração, quase que “magnética” e natural, de atenção da mídia, doadores e de eleitores indecisos. Por outro lado, os adversários do líder nas pesquisas, via de regra, lançam mão de ataques e “incursões” nos estratos de eleitores alinhados ao favorito do momento. Isso pode inclusive moldar a narrativa e o curso de uma eleição.
Entretanto, as pesquisas não têm o poder de saber exatamente qual será a escolha do eleitor no dia da votação, por vezes bastante distante de quando são realizadas, até porque, em tempos de redes sociais e de uma liquidez volumosa e não muito qualitativa de “informações”, a decisão tardia e emocional na escolha do voto, muitas vezes não consegue ser medida.
Lamentavelmente, a postura de alguns candidatos, justamente por não aparecerem na liderança que imaginariam, tem sido de enfrentamento contra as pesquisas, desejando antes quebrar o termômetro que curar a febre. Trata-se de mais um sintoma da pandemia de desinformação que ora atravessamos.
A despeito das críticas de atores muitas vezes descompromissados com os valores da democracia, as pesquisas eleitorais continuam sendo uma ferramenta valiosa para a compreensão do cenário político e do comportamento do eleitorado. O problema não está nas metodologias ou margens de erro, mas na crescente deslegitimação destas ferramentas por quem se vê desfavorecido pelos números. Ao invés de atacar estes atores deveriam refletir.
É possível afirmar que em tempos de incerteza e desconfiança o valor das pesquisas não está em sua capacidade preditiva do futuro, mas em oferecer um retrato revelador. Negar isso é abrir mão de uma das poucas bússolas que temos em meio às tempestades que a política e as redes sociais nos têm imposto.